Enxerto ósseo homólogo

As propriedades osteocondutoras, osteoindutoras e osteogênicas do enxerto autógeno são indiscutíveis e o fazem um padrão. Ao mesmo tempo, o uso de enxerto ósseo homólogo proveniente de bancos de tecidos tem se mostrado clinicamente viável e seguro, e aumentou bastante durante a última década, se somadas suas aplicações em Ortopedia e Odontologia1-3.

O enxerto ósseo homólogo é indicado quando há dificuldade na obtenção de osso autógeno, ou seja, em casos onde existam inconvenientes e a captação deste tecido possa ser desfavorável, como: necessidade de criação de uma segunda área cirúrgica, maior morbidade do sítio doador, dor pós-cirúrgica, maior período de convalescença, suscetibilidade a infecções nos sítios doadores e reabsorção progressiva e constante – aproximadamente 30% no primeiro ano4.

Algumas vantagens, como a facilidade de obtenção em quantidade desejada, a redução do tempo cirúrgico e a não necessidade da manipulação de uma segunda área cirúrgica, tornam o osso homólogo uma alternativa viável nas cirurgias de reconstrução óssea prévia à reabilitação com implantes. Acredita-se que este biomaterial atue como um arcabouço para a neoformação óssea, agindo preferencialmente como osteocondutor e, sugestivamente, como osteoindutor.

A elevada demanda por biomateriais homólogos fez com que o número de fornecedores capacitados também aumentasse, e hoje é possível até mesmo obter fragmentos ósseos personalizados e moldados especificamente para o defeito que desejamos reconstruir.

Normalmente, são utilizados blocos ósseos congelados obtidos da região femoral ou patelar, sendo que a obtenção desse material deve ser feita em bancos de tecido com segurança garantida, preferencialmente nos que seguem os protocolos de obtenção e processamento preconizados e certificados pela Associação Americana de Banco de Tecidos (AATB) ou pela Associação Europeia de Transplantes Músculo-Esqueléticos3.
O que são os bancos de ossos?

Bancos de tecidos são estabelecimentos de saúde que dispõem de instalações físicas, equipamentos, recursos humanos e técnicas adequadas para identificação e triagem dos doadores, além de captação, processamento, armazenamento e distribuição de tecidos e seus derivados, de procedência humana, de doadores vivos ou cadáveres, para fins terapêuticos e de pesquisa.

Nas instituições autorizadas para isso, a seleção de doadores e o processo de captação, armazenamento e estocagem do enxerto homólogo devem ser realizados de forma criteriosa, seguindo não só a legislação brasileira, mas também da AATB, para diminuir a antigenicidade, transmissão de doenças, infecções e outras complicações que possam advir desse procedimento.

Tão importante quanto o conhecimento sobre as bases biológicas do uso dos enxertos de banco é o entendimento da situação legal que embasa sua utilização, de tal modo que o profissional que opte por este tipo de biomaterial possa ter todo o respaldo legal. No Brasil, a normatização dos bancos de tecidos musculoesqueléticos é vinculada à lei federal no 9.434, regulamentada pelo decreto no 2.268, o qual disciplina “a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano e sua aplicação em transplantes, enxertos ou outra finalidade terapêutica”.

A natureza deste tecido nos remete à legislação de transplantes de órgãos, a qual possui cuidados específicos, sobretudo na rastreabilidade e biovigilância. O desenvolvimento de diretrizes rígidas de colheita de tecido, processamento, armazenamento e manutenção de registros diminui consideravelmente o risco de infecção primária e antigenicidade, o que garante total segurança ao paciente que irá receber o enxerto.
Quais são as informações necessárias para efetuar, com segurança, um tratamento com o uso do banco de ossos?

Existem diversas configurações de osso homólogo disponíveis atualmente, incluindo osso particulado, pastilhas de cortical óssea, cubos de osso esponjoso e cubos mistos (com osso esponjoso e cortical). Porém, muitas destas configurações não poderiam nem ao menos ser consideradas se trabalhássemos com osso obtido de origem autógena, devido principalmente ao comprometimento estrutural que a retirada de tamanhas quantidades de tecido ósseo causaria ao tecido doador3. Além disso, o osso homólogo pode ser trabalhado de maneira muito específica, criando blocos esculpidos de forma personalizada e suprindo a necessidade exata de cada paciente.

De acordo com o Conselho Federal de Odontologia (CFO), cabe ao cirurgião-dentista: solicitar o tecido adequado e em quantidade suficiente para cada procedimento a ser realizado; utilizar a técnica de manipulação conforme as instruções das etiquetas dos tecidos, com total assepsia e seguindo normas de biossegurança; utilizar cada tecido em um único paciente, registrando sempre o lote de identificação que consta na etiqueta no prontuário do paciente; nunca rearmazenar ou aproveitar sobras de tecidos; relatar eventos adversos ao banco de ossos, quando ocorrerem; e certificar-se de que o banco de ossos seja devidamente credenciado no Sistema Nacional de Transplante e esteja com seu credenciamento válido.
Ao se submeter a este tipo de tratamento odontológico, quais os principais pontos aos quais o paciente precisa ficar atento? Existem riscos neste tipo de tratamento?

Embora existente, o risco de transmissão de doenças por meio desse biomaterial é reduzido por seu processamento (o material é obtido fresco, tem todo o conteúdo celular removido por centrifugação e congelamento a baixíssima temperatura). Porém, esse mesmo processamento causa deterioração de suas propriedades biológicas, por diminuir sua resistência mecânica e eliminar toda a fase celular do tecido, que é considerado primeiramente osteocondutor, com pouca capacidade osteoindutiva. Apesar disso, seu uso clínico tem aumentado e resultados atuais demonstram que, apesar de apresentar um processo de remodelação mais lento, esse biomaterial pode ser usado na regeneração de defeitos ósseos de forma muito previsível1-2,4-7.
Qual a previsibilidade em longo prazo no tratamento com enxertos de banco?

Enxertos homólogos podem garantir uma boa estabilidade do tecido mole e duro, além de uma densidade óssea aceitável em pacientes submetidos a este tipo de enxertia, como vem sendo demostrado em estudos atuais sobre o tema1-7.

A escolha correta do tecido homólogo (dimensões, forma e espessura) tem implicações cruciais para o grau de atrofia durante a neoformação óssea. A reabsorção de um enxerto ósseo homólogo durante a fase de regeneração depende também do método de preparação no banco de tecidos, por isso a importância do local de escolha e das legislações envolvidas para aquisição destes materiais4.

A literatura considera que as taxas de osseointegração e, em consequência, o sucesso longitudinal de implantes instalados em áreas enxertadas são inferiores, comparativamente às áreas não enxertadas.

É importante salientar que a remodelação óssea mais lenta associada ao biomaterial homólogo, conforme demonstrada por Spin-Neto e col. em 2013 e 2015, pode interferir diretamente na osseointegração de implantes instalados em áreas enxertadas. Nestes estudos, a avaliação em curto prazo dos parâmetros relacionados à osseointegração (contato osso/implante e área óssea formada entre as roscas) dos mini-implantes instalados nas áreas enxertadas demonstrou similaridade entre os grupos observados. Os valores obtidos foram compatíveis ao sucesso em todas as regiões estudadas ao redor desses mini-implantes e de forma generalizada.

Estudos recentes mostram que a neoformação óssea, a manutenção óssea volumétrica e a osseointegração de implantes em áreas enxertadas com biomaterial homólogo têm apresentado alta previsibilidade e altas taxas de sucesso1-7. O sucesso de qualquer procedimento regenerativo depende de fatores que vão desde um rigoroso planejamento pré-operatório até a avaliação completa da saúde do paciente, bem como a previsibilidade de seleção da técnica cirúrgica adequada e a experiência profissional em executar a técnica de maneira segura e responsável.
REFERÊNCIAS

• Spin-Neto R, Stavropoulos A, Colett i FL, Pereira LA, Marcantonio Jr. E, Wenzel A. Remodeling of cortical and corticocancellous fresh-frozen allogeneic block bone grafts-a radiographic and histomorphometric comparison to autologous bone grafts. Clin Oral Implants Res 2015;26(7):747-52.

• Spin-Neto R, Stavropoulos A, Colett i FL, Faeda RS, Pereira LA, Marcantonio Jr. E. Graft incorporation and implant osseointegration following the use of autologous and fresh-frozen allogeneic block bone grafts for lateral ridge augmentation. Clin Oral Implants Res 2014;25(2):226-33.

• Spin-Neto R, del Barrio RAL, Colett i FL, Marcantonio E, Marcantonio Jr. E. Tecido ósseo homólogo para utilização em Odontologia: revisão de literatura. ImplantNews 2010;7:555-60.

• Silva E, Ferraz EP, Martins Neto EC, Chaushu L, Chaushu G, Xavier SP. Volumetric stability of fresh frozen bone blocks in atrophic posterior mandible augmentation. J Oral Implantol 2016, Oct 18.

• Krasny M, Krasny K, Fiedor P, Zadurska M, Kamiński A. Long-term outcomes of the use of allogeneic, radiation-sterilised bone blocks in reconstruction of the atrophied alveolar ridge in the maxilla and mandible. Cell Tissue Bank 2015;16(4):631-8.

• Margonar R, Queiroz TP, Saito CT, Luvizuto ER, Betoni-Júnior W, de Oliveira JC et al. Prosthetic rehabilitation using short dental implants associated with homogenous bone graft . J Craniofac Surg 2015;26(3):946-50.

• Deluiz D, Oliveira LS, Pires FR, Reiner T, Armada L, Nunes MA et al. Incorporation and remodeling of bone block allografts in the maxillary reconstruction: a randomized clinical trial. Clin Implant Dent Relat Res 2016, Sep 8.